Postagens

Mostrando postagens de novembro, 2020

No fim das contas, o vaqueiro escritor

Imagem
Sam Shepard (1943-2017) E vi a mim mesma com Sam na cozinha dele em Kentucky, e estávamos falando da escrita. No fim das contas, ele dizia, tudo serve de forragem para uma história, o que significa, acho, que somos todos forragem. Estava sentada na cadeira de madeira de espaldar reto. Ele estava de pé olhando para mim como sempre. “Papa was a rolling stone” tocava no rádio, que era marrom no estilo anos 40. E pensei, quando ele esticou a mão para tirar o cabelo dos meus olhos, o problema dos sonhos é que no fim a gente acorda. Assim termina O ano do macaco (2019), último livro que li de Patti Smith. Sam é Sam Shepard. Dramaturgo ganhador do Prêmio Pulitzer em 1979 e do PEN/Laura Pels em 2009. Escreveu três coletâneas de contos e mais de cinquenta peças. Partes do livro Crônicas de motel (1983) estão presentes no filme cult Paris, Texas (1984), dirigido por Wim Wenders e vencedor da Palma de Ouro em Cannes, do qual Shepard é roteirista. Atuou em mais de sessenta filmes e recebeu uma

Dentro de nós

Imagem
Ryûnosuke Akutagawa (1892-1927)      Ainda não pude assistir Rashomon , mas fiquei com ele na cabeça e perguntei ao meu amigo sobre os contos mencionados na crônica*. São dois: “Rashômon” e “Dentro do bosque”, do grande expoente do moderno conto japonês, Ryûnosuke Akutagawa (Tóquio, 1892-1927). Encontrei-os no livro Rashômon e outras histórias (1. ed., Paulicéia, 1992), na tradução de Madalena Hashimoto Cordaro e Junko Ota. A introdução elaborada por Madalena Hashimoto ajuda muito quem pouco entende de literatura japonesa e não conhece o escritor, detentor de uma estética que Hashimoto considera contida, além de avisar que a loucura da mãe natural de Akutagawa marcou seu imaginário como escritor. Isso fica mais evidente em “A vida de um idiota”, escrito um mês antes de seu suicídio.    Akutagawa devorou autores como Baudelaire (ao lado de Rimbaud, também é minha obsessão), Gogol e Strindberg e sua grande contribuição à literatura japonesa foram os escritos curtos em prosa. Segun

De café, literatura e sonhos

Imagem
Patti Smith                                                                             - Não é fácil escrever sobre nada. Era o que um vaqueiro ia dizendo quando entrei no sonho. Vagamente bonito e intensamente lacônico, ele se balançava numa cadeira dobrável inclinada para trás, a aba do seu chapéu Stetson roçando a parede pardacenta no lado de fora de um café solitário. Esse fragmento do texto de abertura de Linha M (2016), da “poetisa do punk” Patti Smith, foi amor à primeira vista. Leio e releio. Torna-se mais intenso na medida que vou descobrindo a arte narrativa de Patricia Lee Smith. Amante de literatura e de café, vou mapeando em sua odisseia pessoal os escritores admirados por ela. Temos muito em comum. Gostamos de Haruki Murakami, Sylvia Plath e o maldito, Rimbaud. Antes mesmo de ouvir a música/poesia de Patti Smith, tornei-me fã de sua escrita. Há certa cronologia nas viagens narradas pela escritora. Linha M me levou a Só garotos , livro anterior (2011).   O amor por oraç